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Jornal do Brasil, 21/10/1978
Carlos Drummond de Andrade
Algum dia você já parou para pensar que os animais também têm
direitos? E que cabe ao homem reconhecer esses direitos, num
universo cada dia mais controlado pelo ser humano?
Pois então fique sabendo que 30 anos depois de votada pela ONU, em
Paris, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, a UNESCO,
também em Paris, acaba de aprovar a Declaração Universal dos
Direitos do Animal, na mesma trilha filosófica que inspirou o
primeiro documento. E não foi por iniciativa direta das associações
de proteção aos animais, tantas vezes acusadas (injustamente) de
passionalismo. Quem propôs a Declaração foi um cientista ilustre, o
Dr. Georges Heuse, secretário-geral do Centro Internacional de
Experimentação de Biologia Humana, organização da qual participam
luminares da ciência mundial.
Os direitos do homem foram definidos, em 1948, num corpo de 31
artigos. Os do animal cabem em 14. A declaração de 1978 é precedida
de uma breve "Declaração dos Pequenos Amigos dos Animais".
Compreende-se. É necessário introduzir no processo educativo a
consciência da vida como um todo natural, pois só assim o homem
feito saberá honrar seu compromisso ético para com o meio em que se
desenrola o seu destino.
Mas os comentários ficam para depois. No momento, o importante é
divulgar o mais possível os textos de Paris, e da minha parte começo
a fazê-lo agora:
DECLARAÇÃO DOS PEQUENOS AMIGOS DOS ANIMAIS
"1. Todos os animais têm, como eu, direito à vida e a
felicidade.
2. Não abandonarei o animal que vive em minha companhia,
assim como não desejaria que meus pais me abandonassem.
3. Não maltratarei os animais; eles sofrem como a gente.
4. Não matarei animais. Matar por divertimento ou por
dinheiro é crime.
5. Os animais têm, como eu, direito a viver em liberdade. Os
circos e os jardins zoológicos são prisões de animais.
6. Aprenderei a observar, a compreender os animais e a gostar
deles. Os animais me ensinarão a respeitar a natureza e a vida."
PREÂMBULO
Considerando que todo animal possui direitos;
Considerando que o desconhecimento e o desprezo desses direitos
levaram e continuam levando o homem a cometer crimes contra a
natureza e contra os animais;
Considerando que o reconhecimento, pela espécie humana, do direito à
existência de outras espécies animais constitui o fundamento da
coexistência das espécies no mundo;
Considerando que genocídios são perpetrados pelo homem e ameaçam ser
perpetrados;
Considerando que o respeito aos animais pelo homem está ligado ao
respeito dos homens entre si;
Considerando que a educação deve ensinar desde a infância a
observar, compreender, respeitar e amar os animais, é proclamado o
seguinte:"
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO ANIMAL
"Artigo 1º. Todos os animais nascem iguais perante a vida e
têm os mesmos direitos à existência.
Art. 2º. O homem, como espécie animal, não pode exterminar os
outros animais, ou explorá-los violando este direito; tem obrigação
de colocar os seus conhecimentos a serviço dos animais.
Art. 3º. 1) Todo animal tem direito à atenção, aos
cuidados e à proteção do homem.
2) Se a morte de um animal for necessária, deve ser
instantânea, indolor e não geradora de angústia.
Art. 4º. 1) Todo animal pertencente a espécie selvagem tem
direito a viver livre em seu próprio ambiente natural, terrestre,
aéreo ou aquático, e tem direito a reproduzir-se.
2) Toda privação de liberdade, mesmo se tiver fins
educativos, é contrária a este direito.
Art. 5º. 1) Todo animal pertencente a uma espécie
tradicionalmente ambientada na vizinhança do homem tem direito a
viver e crescer no ritmo e nas condições de vida e liberdade que
forem próprias de sua espécie.
2) Toda modificação deste ritmo ou desta condições, que for
imposta pelo homem com fins mercantis, é contrária a este direito.
Art. 6º. 1) Todo animal escolhido pelo homem para companheiro
tem direito a uma duração de vida correspondente à sua longevidade
natural.
2) Abandonar um animal é ação cruel e degradante.
Art. 7º. Todo animal utilizado em trabalho tem direito à
limitação razoável da duração e da intensidade desse trabalho, a
alimentação reparadora e repouso.
Art. 8º. 1) A experimentação animal que envolver sofrimento
físico ou psicológico é incompatível com os direitos do animal, quer
se trate experimentação médica, científica, comercial, ou de
qualquer outra modalidade.
2) As técnicas de substituição devem ser utilizadas e
desenvolvidas.
Art. 9º. Se um animal for criado para a alimentação, deve ser
nutrido, abrigado, transportado e abatido sem que sofra ansiedade ou
dor.
Art. 10º. 1) Nenhum animal deve ser explorado para
divertimento do homem.
2) As exibições de animais e os espetáculos que os utilizam
são incompatíveis com a dignidade do animal.
Art. 11º. Todo ato que implique a morte desnecessária de um
animal constitui biocídio, isto é, crime contra a vida.
Art. 12º. 1) Todo ato que implique a morte de um grande
número de animais selvagens constitui genocídio, isto é, crime
contra a espécie.
2) A poluição e a destruição do ambiente natural conduzem ao
genocídio.
Art. 13º. 1) O animal morto deve ser tratado com respeito.
2) As cenas de violência contra os animais devem ser
proibidas no cinema e na televisão, salvo se tiverem por finalidade
evidenciar ofensa aos direitos do animal.
Art. 14º. 1) Os organismos de proteção e de salvaguarda dos
animais devem ter representação em nível governamental.
2) Os direitos do animal devem ser defendidos por lei como os
direitos humanos." |